Imagine ser liberado do hospital mesmo sem condições físicas ou estrutura mínima em casa para continuar o tratamento. Infelizmente, esse cenário é mais comum do que se imagina. Pacientes têm sido pressionados por hospitais ou planos de saúde a deixarem leitos, mesmo quando a alta médica é precipitada e coloca sua saúde — e até sua vida — em risco.
Esse tipo de conduta é chamado de alta hospitalar indevida, e pode configurar grave violação ao direito à saúde e à dignidade da pessoa humana. Neste artigo, vamos explicar quando a alta é considerada ilegal, quais são os direitos do paciente e como buscar amparo jurídico nesses casos. ( Tempo de leitura: 7 minutos)

O que é alta hospitalar indevida?
A alta hospitalar deve ocorrer quando o médico responsável considera que o paciente está clinicamente apto a continuar o tratamento fora do ambiente hospitalar. No entanto, muitos pacientes relatam ter sido liberados:
- Sem condições físicas ou clínicas adequadas;
- Sem a estrutura mínima em casa (oxigênio, cama adaptada, assistência);
- Sem plano de continuidade terapêutica (fisioterapia, medicação, cuidados especializados);
- Por pressão do hospital ou do plano de saúde para liberar o leito.
Essas situações configuram alta precoce ou indevida e podem agravar o estado de saúde do paciente.
Pressão por parte do hospital ou convênio: isso é legal?
Não. Nenhum hospital ou plano de saúde pode forçar ou induzir um médico a emitir alta contra sua vontade técnica. Tampouco pode constranger a família para desocupar o leito por motivos financeiros ou de disponibilidade.
De acordo com o Código de Ética Médica, é dever do médico zelar pela continuidade do tratamento adequado, e qualquer alta deve ser baseada em critérios clínicos — não administrativos.
Além disso, o Código de Defesa do Consumidor (CDC) protege o paciente de práticas abusivas por parte de planos de saúde. Já a Constituição Federal, no artigo 196, garante o direito à saúde como um direito de todos e dever do Estado e de seus prestadores indiretos.

Quais os riscos da alta hospitalar sem estrutura em casa?
- Reinternações frequentes, muitas vezes em estado agravado;
- Complicações clínicas evitáveis, como infecções ou tromboses;
- Ausência de tratamento complementar, como fisioterapia, oxigenoterapia ou cuidados de enfermagem;
- Sobrecarga para os familiares, que não têm preparo técnico para assumir os cuidados.
Em alguns casos, o paciente sai do hospital com indicação de tratamento em regime de home care, mas o plano de saúde nega o serviço ou os insumos necessários (fraldas, oxigênio, cuidador, etc.), tornando a alta impraticável e perigosa.
O que fazer em caso de alta indevida?
1. Peça a justificativa por escrito
Todo paciente tem direito de solicitar que o hospital forneça, por escrito, o motivo da alta e o nome do médico responsável. Essa documentação será fundamental em caso de ação judicial.
2. Registre fotos e vídeos da condição do paciente
Se possível, documente o estado clínico da pessoa que recebeu alta, as dificuldades em casa e a ausência de estrutura. Esses registros podem servir como prova.
3. Guarde e peça cópias do prontuário médico
Você tem direito ao acesso ao prontuário completo. Ele pode demonstrar que a alta foi precipitada ou que havia recomendação de continuidade de tratamento. (Leia também)
4. Procure apoio jurídico especializado
Com esses documentos, é possível entrar com ação judicial exigindo:
- Suspensão ou cancelamento da alta;
- Internação imediata ou home care adequado;
- Indenização por danos morais e materiais, caso haja agravamento da saúde;
- Multa por prática abusiva do plano de saúde.

Decisões judiciais favoráveis
Tribunais têm reconhecido a ilegalidade da alta hospitalar prematura, especialmente quando não há estrutura adequada para a continuidade dos cuidados. Veja exemplos:
“É abusiva a conduta do plano de saúde que, visando economia, pressiona pela alta de paciente em quadro clínico grave, colocando sua vida em risco.” — TJSP
“A negativa de suporte domiciliar após alta hospitalar, com indicação médica de continuidade assistencial, enseja o dever de indenizar.” — TJMG
A alta hospitalar deve ser um ato técnico, responsável e orientado à recuperação plena do paciente. Quando ela é imposta por razões administrativas ou sem respaldo clínico, pode gerar danos sérios — e cabe à Justiça corrigir esse abuso.
Referências
- Código de Ética Médica – CFM: https://portal.cfm.org.br
- Constituição Federal – Art. 196: https://www.planalto.gov.br
- Código de Defesa do Consumidor – CDC: https://www.planalto.gov.br